ALGUMAS LIVRARIAS SÃO NECROTÉRIOS

livrarias, cemitérios ou jardins?
ainda há meses vos falava da falta de espaço dado às obras de autores portugueses, nas ditas "livrarias de massa". De um modo geral, os funcionários que trabalham nas livrarias de grandes superfícies, como a Bertrand ou a Fnac, etc., vendem os livros como mera cosmética, por isso não vêem os autores portugueses como um bom investimento, atribuindo-lhes espaços medíocres e dando pouco visibilidade à literatura contemporânea do nosso país.

Como se não bastasse, na maioria dos casos, nos escaparates atribuídos aos autores portugueses, encontramos, geralmente, todos os autores lusófonos; aos nacionais, apenas se dá ênfase aos escritores ditos mais mediáticos.

Nestas livrarias de grandes superfícies, depressa são despejados, dos escaparates para o armazém, autores de enorme referência, como Vergílio Ferreira, que parece estar cada vez mais esquecido. Como se não bastasse há, nalgumas livrarias portuguesas - como em tudo - a cultura literária do necrotério, um autor falecido é lhe imediato dado um espaço de protagonismo mórbido. Como nestes últimos anos, infelizmente, muitos dos grandes autores faleceram, os escaparates do cantinho dedicado à literatura portuguesa edificaram autênticos cemitérios: Mário Cesariny, Eugénio de Andrade, Fiama Hasse P. Brandão; Sophia M. B. Andresen, Luís Pacheco… e mais recentemente a minha querida Maria Gabriela Llansol. Ainda há algumas semanas, encontrar um livro de Llansol, numa "livraria de massa", era quase impossível e a visibilidade dada a autora era rara ou inexistente. Bastou a autora falecer e os escaparates foram ao baú, enchendo-se de títulos de obras como epitáfios , e dos livros fizeram as lápides de uma literatura que não morreu e nunca morrerá, encontrando-se cada vez mais viva entre os seus leitores.

Resta-nos, felizmente, um escape, as livrarias das esquinas, das ruas, das paixões que ainda existem, e que são muitas, são essas que frequento, criando amizades e cumplicidades com os verdadeiros promotores das obras portuguesas. Nessas livrarias, não há necrotério, mas sim a apologia da vida, dos autores vivos (mesmo alguns terem já falecido, não sei se me entendem). Os funcionários dessas livrarias, que recomendo, são gente séria, verdadeiros apaixonados, que não gostam de passear por cemitérios, mas por jardins de língua portuguesa. Para esta gente, um muito obrigado

Comentários

Victor Nogueira disse…
Viva
Poderia subscrever este texto, que tb resolvi transcrever no Galeria & Photomaton, esperando que se não importe.
Lembro-me que uma vez fui à Sá da Costa em busca de livros de teatro e descobri preciosidades e «antiguidades», empoleirado num escadote. Mas noutras livrarias como a Barata, a FNAC ou a Bertrand o teatro, p. ex., está nas prateleiras de baixo, forçando o interessado a desistir ou a ficar numa posição incómoda, porque a única aceesível seria estirar-se no chão.de barriga para baixo com quatro braços e mãos, dois para se apoiar e dois para pesquisar e folhear. O mesmo sucede com a poesia, por vezes. Isto para não falar nas grandes superfícies, onde os livros são como batatas que brilham pela casca e com um indíce de «envelhecimento» e descartabilidade impressionantes.
Abraço
VN
Moura Aveirense disse…
Cada vez me desgosta mais comprar livros nas grandes cadeias... há algum tempo, fui a uma dessas cadeias (que tem a sua maior loja em Aveiro) à procura do último livro de Nuno Júdice (que tinha acabado de sair); disseram-me que teriam de ir procurá-lo ao armazém, pois eu tinha de compreender "que eles não tinham espaço para ter todos os livros nos escaparates da loja"... mas acabaram por não o encontrar também no armazém... enfim.

Boa Páscoa, Moura Aveirense

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